quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Direito Constitucional II - Lição 04 - Direitos e garatinas fundamentais, parte 3

Direitos em espécie

     As liberdades públicas não são absolutas, uma encontra parâmetro nas outras, elas se auto-regulam.
     O direito à vida abrange o direito de não ser morto, o direito à vida digna e o direito de continuar vivo; todos esses direitos, cabe ao Estado assegurar. Na Constituição Federal contempla o direito à vida como uma garantia fundamental, a qual não pode ser abolida.
     Seu significado constitucional é amplo, porque se conecta com o direito à liberdade, à igualdade, à dignidade, à alimentação, ao vestuário, ao lazer, à educação, à saúde, à habitação, à cidadania, aos valores sociais do trabalho e da livre-iniciativa. (BULOS, 2012, pág. 539)

CF, Art. 5º, caput, - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.

     Aspecto relacionado ao direito à vida é o seu oposto, ou seja, a morte. Seria um retrocesso social ou evolução reacionária caso fosse admitida a pena de morte no Brasil, por isso, a doutrina moderna defende que não se pode ter previsão desta pena nem em face do poder constituinte originário.
     Na Carta Constitucional há previsão da pena de morte em caso de guerra declarada, trazendo uma certa relativização à esse preceito.

     A doutrina tradicionalista defende que o poder constituinte originário teria liberdade para introduzir a pena de morte no ordenamento jurídico; já a doutrina moderna sustenta que as questões sociais e culturais seriam balizadores dessa atuação do constituinte originário, e que a previsão de pena de morte em texto constitucional seria retroceder socialmente, assim, a pena capital não poderia constar na Carta Magna nem em face do poder constituinte originário.
        Mais um aspecto relacionado ao direito à vida é o aborto, o qual é caracterizado pela interrupção da gravidez antes do termo normal, com ou sem expulsão do feto, espontâneo ou provocado (BULOS, 2012, pág. 541). Muito bem apontado por Bulos, o direito à vida consta como garantia fundamental, e conforme o Art. 60, §4º, IV, não é admitido emenda tendente a abolir essa garantia.
     Existe exceção no Código Penal apenas quanto ao aborto necessário ou o resultante de estupro, que não deixam de proteger à vida; no primeiro caso a mãe tem risco de morte e no segundo é o respeito à vida da vítima do crime de estupro, ou, como cita Bulos (pág. 541), "preservando a liberdade sexual da mulher".

CF, Art. 60.§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:IV - os direitos e garantias individuais.
CP, Art. 128 - Não se pune o aborto praticado por médico:  (Vide ADPF 54)
Aborto necessário - I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante;
Aborto no caso de gravidez resultante de estupro - II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.


     Outro aspecto do direito à vida, o qual foi muito discutido e com repercussão na mídia, é o fato da antecipação terapêutica do parto de feto anencéfalo. De acordo com o site BBC: "Dados globais indicam que a incidência de anencefalia é de em média 1 em cada 10 mil gestações, mas – por razões não totalmente compreendidas – o Brasil é um dos países com o maior número de casos" (http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2013/05/130522_anencefalia_abre_pai.shtml). 
     Em decisão extremamente apertada, no julgamento da ADPF 54,  foram 8 votos a favor e 7 contrários. Para o STF a vida começa com a função cerebral e por isso não há o que ser tutelado, se a mãe quiser poderá interromper a gestação. Se a morte é diagnosticada quando cessam as funções cerebrais, então a vida também será analisada por esse parâmetro.
     Vários segmentos sociais participaram, por meio de consulta popular, assim auxiliaram na decisão tomada pelo STF.
 
     Mais um aspecto intrínseco ao direito à vida é a questão da Lei de biossegurança (Lei 11.105/2005), a qual permitiu que se fizesse pesquisa com célula tronco embrionária, então, entre descartar as células ou serem aplicadas em pesquisas, permitiu-se a pesquisa. O entendimento foi de que não existia vida, por isso permitiu-se as pesquisas com as células tronco.

Lei Biossegurança: Art. 1º Esta Lei estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização sobre a construção, o cultivo, a produção, a manipulação, o transporte, a transferência, a importação, a exportação, o armazenamento, a pesquisa, a comercialização, o consumo, a liberação no meio ambiente e o descarte de organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, tendo como diretrizes o estímulo ao avanço científico na área de biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saúde humana, animal e vegetal, e a observância do princípio da precaução para a proteção do meio ambiente.
Art. 3º Para os efeitos desta Lei, considera-se: XI – células-tronco embrionárias: células de embrião que apresentam a capacidade de se transformar em células de qualquer tecido de um organismo


     Mais um aspecto inerente ao direito à vida é a prática da eutanásia, também chamada de morte piedosa, "realizada a pedido do próprio doente, ante a sua incurabilidade e sofrimento insuportável" (BULOS, 2013, pág. 545). O terceiro que auxilia na morte de outrem é enquadrado no crime de homicídio (Art. 121, CP). Tema proibido em todas as formas: eutanásia, ortotanásia e distanásia.
     E por fim, o último aspecto integrado ao direito à vida é quanto às Testemunha de Jeová, as quais não aceitam transfusão de sangue. A situação se complica em emergências/ urgências, nesses casos prima-se pelo uso de técnicas alternativas e apenas em última hipótese utiliza-se a transfusão sanguínea; em nome do direito à vida, o médico estaria autorizado a salvar a vida.
     São vários os casos de processos judiciais relacionados ao tema, para ilustrar trago um do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, no qual ocorre a recusa à transfusão, mas por não existir meios alternativos o juiz decide pelo improvimento do recurso.

2004.002.13229-AGRAVO DE INSTRUMENTO
DES. CARLOS EDUARDO PASSOS - Julgamento: 05/10/2004 - DÉCIMA OITAVA CÂMARA CÍVEL
AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA ANTECIPADA. Testemunha de Jeová.Recusa à transfusão de sangue. Risco de vida. Prevalência da proteção a esta sobre a saúde e a convicção religiosa, mormente porque não foi a agravante, senão seus familiares, que manifestaram a recusa ao tratamento. Asseveração dos responsáveis pelo tratamento da agravante, de inexistir terapia alternativa e haver risco de vida em caso de sua não realização. Recurso desprovido.


     O princípios da isonomia, também contemplado no caput do art. 5º da CF, consiste em tratar igualmente à todos, sem distinção. Existem duas espécies de igualdades, a formal tratada no texto da lei e a igualdade material, a qual proporciona a vivência da isonomia sentida pelo sujeito, seria a efetivação da isonomia, saindo do papel e passando a concretizar na vivência da sociedade; essa igualdade é garantida na CF por meio dos direitos sociais.
 
     "A grande questão que se coloca com relação ao vetor da isonomia é definir quais as situações de igualdade e quais as de desigualdades". (BULOS, 2012, pág. 551), e para fazer esse nivelamento desenvolveram as ações afirmativas, a maior ação que existe no Brasil são as cotas nas universidades.
 
     A igualdade entre homem e mulher é garantida constitucionalmente, e para nivelar as relações existem alguns dissemelhanças entre direitos para homens e mulheres, como exemplo a aposentadoria para a mulher que se dá 5 anos antes da dos homens, e ainda o direito às presidiárias de permanecerem com os filhos menores por período determinado, testes físicos em concurso tem exigência menor para mulheres, e por último (e questionável pela doutrina) à prerrogativa de foro para mulher nas ações de separação. 
 
     Outro princípio tão importante quanto os que já foram citados é o princípio da legalidade, dento do Estado Democrático de Direito toda atitude deve ser voltada e fundamentada na Lei. Os Poderes Públicos e os particulares devem se vincular ao que dispõe a lei. A legalidade para o Poder Público é restrita, só pode fazer o que a lei permite; já para o particular é mais flexível, pode fazer tudo que a lei não proíbe.
     A reserva legal vem expressa da seguinte maneira: "lei estabelecerá", "nos termos da lei ordinária", então o disciplinamento tem que vir por Lei; percebe-se que a reserva legal é mais restrita e a legalidade tem conceito mais aberto, aplicando-se aos particulares e ao poder público.


      A proibição à tortura, para Uadi seria absoluta, "sob pena de fulminar o arcabouço do Estado Democrático de Direito". (BULOS, 2012, pág. 561)

CF, Art. 5º, III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante


    Torturar seria constranger alguém mediante a prática de violência da grave ameaça causando dor, pavor e sofrimento físico e mental (BULOS, 2012, pág. 562), o qual visa tão somente obter informações, declaração da vítima.
     Nesse contexto, a súmula vinculantes nº 11 do STF trata do uso das algemas. Em julgamento do Habeas Corpus (HC) 91952, em Novembro de 1999, pelo STF, o ministro Eros Grau afirma que o uso de algemas “é uma prática aviltante que pode chegar a equivaler à tortura, por violar a integridade física e psíquica do réu”.


STF, Súmula Vinculante 11: Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.


  • Referências
-   BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional,7ª ed. rev. e atual. de acordo com a EC n 70/2012. São Paulo: Saraiva, 2012.
- Aula 14/08/2013, Direito constitucional II, Profª. Petrúcia, com anotações de Régia Carvalho.
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Bons estudos!

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