segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Persuasão racional: sistema de análise de prova


Régia Carvalho
Elaborado em Outubro/2013, atualizado Janeiro/2018
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1. Introdução


      Prova é aquilo que serve para estabelecer uma verdade por verificação ou demonstração1. Essa verdade pode ser demonstrada tanto pelo autor quanto pelo réu, ou ainda pelo juiz, quando entender necessário2.

      No processo de conhecimento, o objetivo é apurar as provas do fatos alegados, com a finalidade de formar a convicção do julgador em torno desses fatos.

      Para estabelecer a convicção, o juiz deve analisar todas as provas apresentadas e fundamentar a sentença baseada nos fatos e provas apresentadas, mas nem sempre foi assim, até chegar ao sistema de valoração de provas atual o julgador passou por restrições - no sistema da prova legal, por liberalidades - no sistema da livre convicção e atualmente um meio termo, no sistema da persuasão racional.

2. Sistemas de análise dos meios de provas


      O sistema do critério legal ou da prova legal foi utilizado no direito romano primitivo e no direito medieval, consistia na análise hierárquica das provas, resultando em uma verdade formal. Cada prova tinha um valor fixo.

      Esse sistema não é utilizado na modernidade, no entanto, ainda há resquícios do sistema da prova legal em nosso ordenamento, como o art. 406, que dá valor absoluto de prova ao instrumento público, quando da substância do ato. Anteriormente ao NCPC havia também o art. 401, que negava valor à prova exclusivamente testemunhal em contratos de valor superior ao décuplo do salário-mínimo3.

      O segundo sistema é o da livre convicção, conforme a própria nomenclatura autodefine, o juiz dispõe livremente da íntima convicção para valoração das provas, pode decidir conforma a própria vontade, opostamente ao critério legal, o juiz poderia decidir contrário às provas produzidas, era “soberano para investigar a verdade e apreciar as provas”4.

      Há um único caso, em nosso ordenamento, que se acolhe o princípio da convicção íntima: é o das decisões do Tribunal do Júri5. Nele não é necessário a fundamentação da decisão, os jurados decidem conforme a própria vontade de acordo com o entendimento das provas apresentadas e dos debates.

      O terceiro método de análise das provas é o da persuasão racional ou livre convencimento motivado. Tal sistema é o adotado pelo Código de Processo Civil, nele o julgamento deve ser baseado nas provas apresentadas no processo, as quais não tem valoração fixada; ao juiz é possível apreciar cada uma das provas e formar o próprio convencimento, mas na sentença fundamentará explicando os fatos e as provas em que utilizou para formar a decisão.

      A convicção fica, pois, condicionada, segundo Amaral Santos: a) aos fatos nos quais se funda a relação jurídica controvertida; b) às provas desses fatos, colhidas no processo; c) às regras legais e máximas de experiência; d) e o julgamento deverá sempre ser motivado6.

3. Persuasão racional


      Sistema consagrado no art. 371 do NCPC7, no qual o juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento.

      É uma forma intermediária entre os sistemas da prova legal e o da livre convicção, visto que haverá a livre apreciação da prova para o juiz formar o próprio convencimento, no entanto deverá motivar os fundamento da decisão. Fugindo assim de uma arbitrariedade já que o julgador estará adstrito às alegações e às provas apresentadas nos autos.

      Caso não haja norma jurídica a ser aplicada, o juiz poderá utilizar regras de experiência comum (NCPC, Art. 3758), como cálculos matemáticos simples, conhecimentos de biologia, fatos culturais. As máximas de experiência “representam, na verdade, percepções em abstrato do que ordinariamente acontece. Integram a cultura média da sociedade (…), sendo noções conhecidas e indiscutíveis...9”.

      As regras de experiência comum, sendo a observação do que ordinariamente acontece, não pode ser confundida com o conhecimento próprio de fatos pelo juiz. Se o julgador tiver alguma impressão particular sobre determinado fato do processo, deve se abster de utilizar na sentença, pois estaria quebrando o princípio da imparcialidade.

      Quando ele tiver ciência privada, não poderá julgar o processo, devendo passá-lo ao seu substituto. A ciência privada permitirá que o juiz seja ouvido como testemunha, mas obstará que ele presida o processo e profira sentença10.

4. Jurisprudência


Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO MONOCRÁTICA. RESPONSABILIDADE CIVIL. CREDISCORE. PROVA ORAL. DESNECESSIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA INOCORRENTE. Trata-se de agravo de instrumento interposto em face da decisão que indeferiu a realização de prova oral. Não há se falar em cerceamento de defesa no caso dos autos, mormente em virtude do indeferimento da prova oral, pois à solução da controvérsia é cabível através da produção de prova documental, haja vista que o litígio versa sobre a legalidade do sistema crediscore. Além disso, o magistrado, como destinatário da prova, pode valorar a necessidade ou desnecessidade dela cotejando os dados existentes nos autos. No ordenamento jurídico pátrio, vige o princípio do livre convencimento fundamentado do juiz ou, também, denominado de persuasão racional. Não é vedado, assim, ao magistrado, julgar a lide sem a produção de prova oral, quando já existentes elementos suficientes para seu convencimento. Inteligência dos artigos 130 e 131 do CPC. Precedentes. Dessa feita, impositiva a manutenção da decisão que indeferiu a realização de prova oral. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO MONOCRATICAMENTE. (Agravo de Instrumento Nº 70056715576, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Niwton Carpes da Silva, Julgado em 08/10/2013). 

5. Referência bibliográfica

- THEODORO JR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento – vol. I – Rio de Janeiro: Forense, 2012

- GONÇALVES, Marcus Vinícios Rios. Novo curso de direito processual civil, volume 1: teoria geral e processo de conhecimento (1ª parte) – 10 ed. - São Paulo: Saraiva, 2013




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1 http://michaelis.uol.com.br/ 
2 NCPC, Art. 370, Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito. Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias. 
3 Marcus Vinícius Rios Gonçalves, 2013, pág. 424 
4 Theodoro Jr., 2012, pág. 441 
5 Marcus Vinícius Rios Gonçalves, 2013, pág. 424 
6 Theodoro Jr., 2012, pág. 442. 
7 NCPC, art. 371.  O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento.
8 NCPC, art. 375.  O juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e, ainda, as regras de experiência técnica, ressalvado, quanto a estas, o exame pericial.
9 Theodoro Jr., 2012, pág. 443. 
10 Marcus Vinícios Rios Gonçalves, 2013, pág. 425.

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