domingo, 14 de setembro de 2014

Usurpação de função pública (Art. 328), Resistência (Art. 329), Desobediência ou resistência passiva (Art. 330), Desacato (Art. 331)


Usurpação de função pública
Art. 328 - Usurpar o exercício da função pública:
Pena – detenção, de 3(três) meses a 2 (dois) anos, e multa.
Parágrafo único. Se do fato o agente aufere vantagem:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

     Usurpar tem sinônimo de tomar, apoderar-se, essa é a ação punida. Ocorre quando o particular não investido de função pública, e consciente disso, executa atos dentro da Administração pública, como se dela fizesse parte.

     O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, e até mesmo o próprio funcionário quando exerce função estranha à sua. O sujeito passivo será o Estado ou secundariamente o particular.

     A consumação se dá com a prática de algum ato de ofício, sendo admissível a tentativa. Não é necessário que tenha auferido vantagem, como prestígio, mais clientes, qualquer tipo de vantagem, mas, de acordo com o parágrafo único, no caso de auferimento de vantagem, material ou moral, para si ou para outrem, a pena é majorada.

     “Distinção: Se o agente entrar no exercício da função pública antes de satisfeitas todas as exigências legais, poderá haver o crime previsto no art. 324 (exercício funcional ilegalmente antecipado). Se praticar ato de ofício após ser suspenso da função pública por decisão judicial, haverá o delito previsto no art. 359 do CP (desobediência à decisão judicial sobre perda ou suspensão de direito)1.”

     Exemplo: Rafaela, professora estatutária da rede municipal, remunerar Bárbara, não funcionária pública, para ministrar as aulas de Rafaela. Neste caso Bárbara responderá por usurpação de função e Rafaela como co-autora (STJ admite co-autoria nesse crime).

     Por qual crime responde o indivíduo que se intitula funcionário público para obter vantagem ilícita, em prejuízo alheio? É preciso distinguir duas situações: a) se o indivíduo, após ter usurpado a função, obtém vantagem ilícita, sem realizar qualquer ato de ofício, deverá responder por estelionato; b) se, ao contrário, o usurpador, assumindo a qualidade de funcionário público, tiver realizado ato de ofício e obtido vantagem, estará configurada a forma qualificada do crime de usurpação de função pública (CP, art. 328, parágrafo único).2


Resistência
Art. 329. Opor-se à execução de ato legal, mediante violência ou ameaça a funcionário competente para executá-lo ou a quem lhe esteja prestando auxílio:
Pena – detenção, de 2 (dois) meses a 2 (dois) anos.
§ 1º Se o ato, em razão da resistência, não se executa:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos.
§ 2º As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à violência.

     Nesse crime protege-se a autoridade e o prestígio da função pública, incriminando a ação de opor-se à execução de ato legal mediante o emprego de violência ou ameaça. A participação do sujeito deve ser ativa, não pode por omissão.

     Essa violência tem que ser empregada contra a pessoa ou pode ser contra o objeto? Por exemplo: jogar pedra ou furar pneu da viatura.... Existem duas correntes, a 1ª sustenta que pode ser contra pessoa ou coisa, já a 2ª corrente, majoritária, afirma que só pode ser contra a pessoa. Se atingir a coisa é crime de desobediência.

     A violência empregada pode ser real ou verbal e a ameaça deve ter o poder de intimidar o funcionário público.

     O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, até terceiros a quem a ordem não é dirigida. Por exemplo Alana joga pedra na polícia para que eles não prendam Carlos, Alana responde por resistência. Se o ato for ilegal a resistência é atípica. Também poderia ser crime de resistência quando um oficial vai junto com outra pessoa para prestar auxilio (terceiro pode não ser funcionário público), a pessoa começa a atirar pedras no oficial e no terceiro para resistir ao cumprimento o ato.

     A consumação ocorre com o emprego da violência ou ameaça contra o funcionário competente, mesmo que não impeça o cumprimento do ato. A tentativa é possível.

     O §2º trata do concurso material de crimes, na qual o agente responde pelos crimes que praticar juntamente com a resistência.

     Desacato e resistência: conforme assevera Victor Eduardo Rios Gonçalves, “o mero xingamento contra funcionário público constitui crime de desacato. Se, no caso concreto, o agente xinga e emprega violência, contra o funcionário público, teria cometido dois crimes, mas a jurisprudência firmou entendimento que, nesse caso, o desacato fica absorvido pela resistência”3.

     “Resistência. Comete o crime previsto no art. 329 do CP o agente que se opõe à voz de prisão legítima dada por policial militar, usando de violência e ameaça. Embriaguez. A embriaguez voluntária não impede a caracterização do delito de resistência. Condenação mantida” (TJRS, Ap. Crim. 70008177768, 4ª Câm. Crim., Rel. Des. Constantino Lisbôa de Azevedo, j. 25-3-2004).”4

     Exemplo: Hanna com pneu do veículo careca na estrada impede o funcionário de apreender o veículo, ficou brigando com o funcionário e foi embora. Mulher que soltou os cachorros na oficiala de justiça.


Desobediência ou resistência passiva
Art. 330 - Desobedecer a ordem legal de funcionário público
Pen: detenção, de 15 (quinze) dias a 6 (seis) meses, e multa

     O verbo desobedecer tem como sinônimos desatender, não aceitar, não se submeter, à ordem legal, sem emprego de violência

     O sujeito ativo desse crime pode ser qualquer pessoa que tenha que cumprir a ordem legal. Como por exemplo a pessoa que está como testemunha em ação judicial. Se for funcionário público que deixe de cumprir ato legal, responder´a por prevaricação.

     “STJ: “HC. Penal. Funcionário público. Ato de ofício. Desobediência. Prevaricação – O Código Penal distingue (Título XI) crimes funcionais e crimes comuns. Evidente, quando o funcionário público (CP, art. 327) pratica ato de ofício, não comete delito próprio de particular. Assim, inviável a infração penal – Desobediência (CP, art. 330 – Crime Praticado por Particular contra a Administração Pública, Título XI, Cap. II). Em tese, admitir-se-á prevaricação (CP, art. 309). Urge, no entanto, a denúncia descrever elementos constitutivos dessa infração penal” (STJ, HC 2628/DF, 6ª T., Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, j. 29-6-1994, DJ 5-9-1994, p. 23122; RSTJ 63/70).”5

     O sujeito passivo é o Estado e, secundariamente, o funcionário público competente para emitir a ordem.

     O agente deve ter consciência da legalidade do ato e da competência do funcionário público para praticá-la, assim, o crime consuma-se com a abstenção, se o ato legal for comissivo; e se a ordem for para não fazer, ou também quando o agente pratica a ação, ou seja, quando o agente deixa de obedecer a ordem legal, seja por açã ou omissão. A doutrina sustenta que deve ter reiteração da conduta para confirmar que a pessoa não quis cumprir a ordem. A tentativa é possível quando o agente comete o que por ordem legal não podia fazer.

     Exemplo: por ação: ultrapassar área militar.

     No caso de profissionais que devam guardar segredo em razão do ofício ou profissão, não configura-se o crime de desobediência. Já a recusa em submeter-se à identificação criminal pode configurar a desobediência.

     Se durante uma blitz o policial solicita que o agente abra a mala do veículo, e o agente usa de violência para impedir, caracteriza-se a resistência. Mas se apenas não deixar abrir é crime de desobediência.

     Juliana acusada de furto, policial manda parar e Juliana sai nadando, é desobediência. Outro exemplo seria o descumprimento da ordem de afastamento de pessoa.


Desacato
Art. 331 - Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela.
Pena: detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, ou multa

     O desacato como sinônimo de desrespeito, irreverência, insubordinação, maldade, é feito com o objetivo de humilhar o funcionário público no exercício de suas funções.

     Tutela-se o prestígio e a dignidade da Administração Pública punindo a ação de desacatar que significa qualquer ato ou emprego de palavras que causem vexame, humilhação ao funcionário público, inclusive com emprego de violência, utilização de gestos ofensivos ou uso de expressões caluniosas, difamantes ou injuriosas.6

     O desacato deve ocorrer contra funcionário no exercício da função pública ou em razão dela, por exemplo, dizer a um funcionário que ele é um apropriador de verbas públicas. Para configurar o crime, o desacato de ocorrer na presença do funcionário ou de forma que ele tome conhecimento diretamente, “por exemplo, proferir a ofensa para que o funcionário que esteja em outra sala a escute, do contrário, o crime praticado poderá ser outro: calúnia, difamação, injúria, na forma majorada (CP, art. 141, II), ameaça etc.”7

     O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, inclusive um funcionário público. E o sujeito passivo, além do Estado, o sujeito desacatado.

     “Desacato. Funcionário público que agride verbalmente Promotor de Justiça. Admissibilidade de figurar como sujeito ativo do crime. Delito que visa a tutelar o prestígio da função pública, não se restringindo tal lesão jurídica somente quando praticada por particular. Inteligência do art. 331 do CP” (TJRJ, RT 760/692).”8

     Sem o conhecimento da qualidade de funcionário público, o sujeito ativo pode responder por injúria, calúnia ou difamação, pois exige-se o dolo específico de praticar o crime de desacato.

     “Desacato. Art. 331 do Código Penal. Sentença condenatória. Inconformidade defensiva. Não se caracteriza o delito de desacato o mero desabafo do réu, especialmente quando não demonstrada a intenção de atingir a honra ou o decoro da atividade do funcionário. Absolvição é medida que se impõe. Deram provimento à apelação” (TJRS, RCrim 71000992123, Turma Recursal Criminal, Turmas Recursais, Rel. Des. Alberto Delgado Neto, j. 4-12-2006).”9

     Para a consumação, não é necessário que o funcionário público se sinta ofendido com os atos ofensivos ou com as palavras proferidas, nem é preciso que terceiros presenciem o desacato. Admite-se tentativa.

     “Distinção: Se a violência ou ameaça forem empregadas com o fim de se opor à execução de ato legal e não com o fim de humilhar, menoscabar a função pública exercida pelo agente, o crime passa a ser o de resistência.”10

     Algumas observações, se for cometido contra mais de um funcionário público configura crime único com pena aumentada. E a mera falta de educação não configura desacato.

     Quanto a embriaguez, a corrente que prevalece diz que a pessoa que está em estado de animo exaltado e não sabe o que esta fazendo a embriaguez retira o caráter criminoso. Mas a outra corrente sustenta que a embriaguez não retira o caráter criminoso, a pessoa estaria com o dolo de agir.

     “Distinção: Não perfaz o crime de resistência o ato de rogar pragas contra o funcionário, cuspir sobre ele ou atirar-lhe urina, fazer gestos ultrajantes, xingá-lo. Até mesmo as vias de fato ultrajantes, por exemplo, dar uma leve bofetada na face do oficial de justiça, não configuram esse delito. São todas hipóteses caracterizadoras do crime de desacato (CP, art. 331). Se o emprego da violência ou ameaça for anterior ou posterior à execução do ato funcional, outro crime poderá configurar-se (ameaça, lesão corporal). Se a violência for empregada com o fim de fuga, após a prisão ter sido efetuada, o crime será aquele do art. 352 do CP.”11

     “Resistência e desacato. Concurso de crimes: São as seguintes decisões: “Concurso Material. Desacato e resistência. Ocorrência. Agente que, após ter ofendido funcionário público no exercício de suas funções, ao ser preso em flagrante, tenta fugir, resistindo à sua recaptura” (TACrimSP, RT 795/616) (TJSP, Ap. Crim. 95.694-3, Rel. Fortes Barbosa, j. 29-4-1991).”12
 
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  • Referência
CAPEZ, Fernando. PRADO, Stela. Código penal comentado. 3. ed. - São Paulo: Saraiva, 2012 (ebook)
 
 


1CAPEZ, Fernando. PRADO, Stela. Código penal comentado. 3. ed. - São Paulo: Saraiva, 2012. pág. 2485,4
2CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal, volume 3, parte especial: dos crimes contra a dignidade sexual a dos crimes contra a administração público (arts. 213 a 359-H). 10. ed. - São Paulo: Saraiva, 2012, pág. 1200,6
3Victor Eduardo Rios Gonçalves, Dos crimes contra os costumes aos crimes contra a Administração, cit., v. 10, p. 151.
4CAPEZ, Fernando. PRADO, Stela. Código penal comentado. 3. ed. - São Paulo: Saraiva, 2012. pág. 2492,9
5CAPEZ, Fernando. PRADO, Stela. Código penal comentado. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. Pág. 2505,3
6CAPEZ, Fernado. PRADO, Stela. Código penal comentado. 3. ed. - São Paulo: Saraiva, 2012, pág. 2521,2
7CAPEZ, Fernado. PRADO, Stela. Código penal comentado. 3. ed. - São Paulo: Saraiva, 2012, pág. 2522,6
8CAPEZ, Fernado. PRADO, Stela. Código penal comentado. 3. ed. - São Paulo: Saraiva, 2012, pág. 2523,5
9CAPEZ, Fernado. PRADO, Stela. Código penal comentado. 3. ed. - São Paulo: Saraiva, 2012, pág. 2525,5
10CAPEZ, Fernado. PRADO, Stela. Código penal comentado. 3. ed. - São Paulo: Saraiva, 2012, pág. 2530,0
11CAPEZ, Fernando. PRADO, Stela. Código penal comentado. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. Pág. 2490,6
12CAPEZ, Fernando. PRADO, Stela. Código penal comentado. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. Pág. 2494,4


 Bons estudos!


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