sexta-feira, 12 de junho de 2015

Acordos para promoção e proteção de investimentos celebrados pelo Brasil


Régia Cristina Alves de Carvalho Maciel¹

¹Aluna de graduação do curso de Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte


  1. Considerações gerais
O Estado brasileiro celebrou em 1994 o Protocolo de Colonia para a Promoção e a Proteção Recíproca de Investimentos no MERCOSUL, uma acordo que prevê a livre circulação dos investimentos entre as partes contratantes, República Argentina, a República Federativa do Brasil, a República do Paraguai e a República Oriental do Uruguai, com a finalidade de criar condições favoráveis para os investimentos de investidores de uma das Partes Contratantes no território de outra Parte Contratante visando intensificar a cooperação econômica e acelerar o processo de integração entre os quatro países.

Ainda no mesmo ano celebrou acordo para Protocolo sobre Promoção e Proteção de Investimentos Provenientes de Estados não membros do MERCOSUL, com o objetivo de evitar condições diferenciais que tivessem o efeito de distorcer os fluxos de investimentos dirigidos à região. O Protocolo estabelece, assim, parâmetros máximos de concessões que podem ser estendidas a investimentos realizados por investidores de Estados não-membros do MERCOSUL em questões tais como a admissão do investimento estrangeiro, a livre transferência do capital investido, compensações em casos de nacionalização ou desapropriação e mecanismos de solução de controvérsias entre o investidor e o país receptor do investimento.

Também celebrou, bilateralmente, Acordos de promoção e proteção recíproca de investimentos com os seguintes Estados: Governo da República Portuguesa, e com o Governo da República do Chile, ambos em 1994; com o Governo do Reino Unido, da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte e com a Confederação Suíça em 1995; com a República Francesa em 1997 e por fim com a República Federal da Alemanha em 1998.
  1. Situação dos atos internacionais
O Protocolo de Colonia para a Promoção e a Proteção Recíproca de Investimentos no MERCOSUL ainda não entrou em vigor, em seu art. 11 prevê a entrada em vigor 30 (trinta) dias após a data de depósito do quarto instrumento de ratificação, sendo que nenhuma das partes contratantes o ratificaram1.

Quanto ao Protocolo sobre Promoção e Proteção de Investimentos Provenientes de Estados não-membros do MERCOSUL, apenas a República Federativa do Brasil não o ratificou (ver anexo), na verdade, o Estado brasileiro recomendou a retirada de tramitação do texto do Protocolo por meio do envio da Mensagem 162 de 08/04/2004 ao Congresso Nacional, acompanhada da Exposição de Motivos do Ministério das Relações Exteriores.

Além desse, a Presidência da República também pediu retirada de tramitação dos Acordos bilaterais de promoção e proteção recíproca de investimentos celebrados com os países citados anteriormente, por meio de Mensagens enviadas dia 13/12/2002 ao Congresso Nacional2.

Diante disto, a questão que se coloca aqui é de saber qual o fundamento jurídico que autoriza o Governo a retirar da pauta um tratado que já tenha enviado aprovação.

Antes de responder, é preciso esclarecer o processo de incorporação de um tratado internacional no ordenamento jurídico brasileiro.

Primeiramente, o acordo internacional é celebrado pelo Chefe de Estado ou por quem o represente. Compete ao Presidente da República, privativamente, celebrar tratados e convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional, nos temos do art. 84, VIII da Constituição Federal.

Ao Congresso Nacional, por sua vez, compete exclusivamente resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional, conforme art. 49, I da Carta Magna. Tal aprovação se dá por meio da promulgação de um Decreto legislativo.

Assim, a Presidência da República submete o acordo internacional à apreciação do Congresso Nacional, essa comunicação se dá por meio do envio de mensagem com a exposição de motivos, juntamente com cópia do ato internacional.

Inicialmente cabe à Câmara dos Deputados, por meios das Comissões de Relações Exteriores e da Comissão de Constituição Justiça e Cidadania, por exemplo, analisarem o pedido de aprovação do tratado. Após esse trâmite o Projeto de lei é enviado para ser apreciado pelo Senado Federal. Neste, o Projeto é analisado pelas Comissões de Relações Exteriores e Defesa Nacional, Comissão de Constituição Justiça e Cidadania, por exemplo. Em sendo aprovado é feita a promulgação por meio de um Decreto legislativo e enviado à Presidência da República para sanção, promulgação e publicação.

Percebe-se que esse trâmite para aprovação do tratado internacional no ordenamento jurídico brasileiro é o mesmo utilizado para o processo das leis nacionais, e como tal se submete aos regimentos internos da Câmara, do Senado e o Regimento Comum do Congresso Nacional, e nesse ponto é possível extrair o fundamento jurídico que autoriza o pedido de retirada de pauta do tratado enviado para aprovação.

Senão vejamos, o art. 42 do Regimento Comum Congresso autoriza ao autor o pedido de retirada de qualquer proposição, por esse dispositivo tem-se a fundamentação jurídica a ser utilizada pela Presidência da República quanto as suas proposições.

Art. 42. A retirada de qualquer proposição só poderá ser requerida por seu autor e dependerá de despacho da Presidência.
Parágrafo único. Competirá ao Plenário decidir sobre a retirada de proposição com a votação iniciada

Corroborando com isto, nos termos do art. 104 e seu §5º do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, também é evidente a aplicação desse artigo às proposições de iniciativa do Poder Executivo:

Art. 104. A retirada de proposição, em qualquer fase do seu andamento, será requerida pelo Autor ao Presidente da Câmara, que, tendo obtido as informações necessárias, deferirá, ou não, o pedido, com recurso para o Plenário.
§ 5º Às proposições de iniciativa do Senado Federal, de outros Poderes, do Procurador-Geral da República ou de cidadãos aplicar-se-ão as mesmas regras.

Ao passo que, no Regimento Interno do Senado Federal não há disposição expressa que legitime o Poder Executivo a solicitar retirada de pauta de proposição, vejamos:

Art. 256. A retirada de proposições em curso no Senado é permitida:
I – a de autoria de um ou mais Senadores, mediante requerimento do único signatário ou do primeiro deles;
II – a de autoria de comissão, mediante requerimento de seu Presidente ou do Relator da matéria, com a declaração expressa de que assim procede devidamente autorizado. (grifos nossos)

Diante disto é possível concluir que o Regimento Comum do Congresso e o Regimento Interno da Câmara dos Deputados autorizam ao Poder Executivo o pedido de retirada de pauta de proposições de sua autoria, aí incluídos os atos internacionais. 

3. Comentários às mensagens que foram enviadas pela Presidência da República com exposição de motivos do Ministério das Relações Exteriores ao Congresso Nacional 
 
3.1 Protocolo sobre Promoção e Proteção de Investimentos Provenientes de Estados não membros do MERCOSUL, concluído em Buenos Aires, no âmbito do Mercosul, e assinado pelo Brasil em 5 de agosto de 1994. 

- Submetido à consideração do Congresso Nacional por meio da Mensagem nº 749, de 1995.
Pelos termos da Mensagem 126 do Poder Executivo, de 08/04/2004, a qual recomendou a retirada de tramitação do Protocolo em análise, basicamente foram ressaltados três aspectos para justificar a retirada de pauta: sobre a indenização para desapropriação, sobre a transferência de recursos para o exterior e quanto a solução de controvérsias.

Acerca da desapropriação, está previsto na Constituição Federal de 1988 que “a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro...”, ao passo que o Protocolo (art. 2º, D, 1) prevê que a indenizações será “justa, adequada, imediata ou oportuna”. Pela exposição de motivos observa-se que aos nacionais brasileiros o recebimento da indenização se dá de forma mais demorada, “por instrumentos financeiros de longa maturação3”, ocorreria nesse caso um desfavor dos nacionais ao contrário do que ocorreria para os investidores estrangeiros que receberiam indenização imediata.

Sobre a transferência de recursos prevê “a livre transferência de seus investimentos e rendas”, “na forma como estão formuladas essas disposições, fica evidente que está bastante restrita a possibilidade de adequação do País ao nível de reservas existente no momento em que uma crise de balanço de pagamentos requeira ocasião melhor para permitir fluxo de transferências4”. 
 
Finalmente, em relação à solução de controvérsias com investidores estrangeiros, primeiramente o Protocolo prevê a solução por meio de consultas amistosas, se não resolvida poderá ser submetida ou aos tribunais competentes do Estado Parte em cujo território foi realizado o investimento ou à arbitragem internacional. Segundo a exposição de motivos, essa regra significa uma renúncia à jurisdição interna; inclusive, na apreciação desta cláusula, a Comissão de Tributação e Finanças da Câmara de Deputados, aprovou o texto com ressalva da cláusula H, a qual trata da Solução de controvérsias entre um investidor de um terceiro Estado e um Estado­ parte receptor do investimento .

A possibilidade de escolha direta da arbitragem internacional por parte do investidor significa o abandono, por parte do Brasil, de um princípio clássico do direito internacional, a regra do esgotamento dos recursos internos a qual prescreve ter o Estado o direito de sanar um suposto ilícito antes que sua responsabilidade internacional seja levantada5. ”

3.2 Acordo sobre Promoção e Proteção Reciproca de Investimentos (APPIs), celebrado entre o Governo da República Federativa do Brasil e
 
- o Governo da República Portuguesa, submetido a consideração do Congresso Nacional pela Mensagem n° 1.158, de 1994;
- o Governo da República do Chile, submetido a consideração do Congresso Nacional pela Mensagem n° 1.159 de 1994;
- o Governo do Reino Unido, da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, submetido a consideração do Congresso Nacional pela Mensagem n° 8, de 1995;
- a Confederação Suíça, submetido a consideração do Congresso Nacional pela Mensagem nº 10, de 1995;
- o Governo da República Francesa, submetido a consideração do Congresso Nacional pela Mensagem nº 652, de 1997;
- o Governo da República Federal da Alemanha, submetido a consideração do Congresso Nacional pela Mensagem nº 755, de 1998;

De acordo com a exposição de motivos para retirada de tramitação dos Acordos bilaterais internacionais acima mencionados, inicialmente é explicado que a finalidade dos Acordos “era contribuir para a moldura jurídica de proteção de investimentos estrangeiros e, portanto, reforçar o potencial do País para captar significativos aportes de recursos externos, sobretudo de pequenos e médios investidores” . Além disso, “procurava o Brasil acompanhar o movimento internacional que, à época caminhava naquela direção. Foi decisiva, naquele momento, a avaliação de que, ao celebrarem acordos de promoção e proteção de investimentos, outros países mostrar-se-iam mais atraentes e seguros que o Brasil aos olhos do investidor estrangeiro.”

Explica ainda que houve, a partir de 1977, questionamentos aos Acordos Multilaterais de Investimentos negociados do âmbito da OCDE, resultando um declínio do apoio político às negociações e então o Congresso Nacional passaram a criticar as APPIs assinadas pelo Brasil.

Além disso, os “Acordos nunca encontraram o respaldo político necessário para sua aprovação”, além de “não mais refletir a tendência que prevalece no cenário internacional”. E ainda que a inexistência desse tipo de acordo não afeta a posição de Brasil como receptor de investimentos.

Foi diante deste cenário e acontecimentos que o Ministério das Relações Exteriores recomendou a retirada de pauta dos Acordos Internacionais, os quais atualmente estão arquivados e insusceptíveis de promulgação.


ANEXO

Transcrição da mensagem nº 162:

"Senhores Membros do Congresso Nacional,
Solicito a Vossa Excelência, de conformidade com a Exposição de Motivos do Senhor Ministro de Estado das Relações Exteriores, interino, a retirada de tramitação do texto do Protocolo sobre Promoção e Proteção de Investimentos Provenientes de Estados Não-Membros do Mercosul, concluído em Buenos Aires, no âmbito do Mercosul, e assinado pelo Brasil em 5 de agosto de 1994, enviado à Câmara dos Deputados com a Mensagem nº 749, de 1995.
Brasília, 8 de abril de 2004 "

Assinado eletronicamente por: Samuel Pinheiro Guimarães Neto



ESTADO DE RATIFICACIONES Y VIGENCIAS DE TRATADOS
Y PROTOCOLOS DEL MERCOSUR Y ESTADOS ASOCIADOS

EXPLICACION 
30 d D 2º IR: 30 días despúes del Deposito del 2º Instrumento de Ratificación/L:Ley/DTO.LEG.: Decreto Legislativo/IR: Instrumento de Ratificación/N:Notificación/D:Deposito/EP:Estado Parte/ EA:Estado Asociado/ ARG:Argentina/BRA:Brasil/PAR:Paraguay/URU:Uruguay/VEN:Venezuela/BOL:Bolivia/CHI:Chile.
Nombre del Documento
DECISION
FECHAS DE LOS DEPOSITOS DE RATIFICACIONES
Entrada en Vigor
Argentina
Brasil
Paraguay
Uruguay
Venezuela
Bolivia
Chile
1
Tratado para la Constitución de un Mercado Común (Tratado de Asunción) - ANEXOS I, II, III, IV y V.
Firmado: Asunción, 26 de marzo de 1991
Español - Português

---
L: 23.981
15-AGO-91
D: 30-OCT-91
DTO. LEG. 197
25-SET-91
D: 30-OCT-91
L: 9/91
15-JUL-91
D: 6-AGO-91
L: 16.196
22-JUL-91
D: 6-AGO-91
Pendiente
---
---
30 d D 3º I.R.29 -NOV-.91
2
Protocolo de Brasilia para la Solución de Controversias.
Firmado: Brasilia, 17 de diciembre de 1991
Español
 - Português
DEC. Nº 01/91
L. 24.102
17-JUL-92
D: 28- DIC- 92
DTO. LEG. 88
1-DIC-92
D: 28-DIC- 92
L: 18/92
2-JUL-92
D: 16-JUL-92
L. 16.348
1-ABR-93
D: 22-ABR-93
---
---
---
NO VIGENTE
(Derogado por el Protocolo de Olivos)
3
Protocolo de Cooperación y Asistencia Jurisdiccional en Materia Civil, Comercial, Laboral y Administrativo (Protocolo de las Leñas).Firmado: Valle de las Leñas, 27 de junio de 1992 
CONTEMPLA AUTORIDAD CENTRAL 

Español - Português
DEC. Nº 05/92
L: 24. 578
D: 3-JUL-96
DTO. LEG. 55
19-ABR-95
D: 16-FEB-96
L: 270
10-DIC-93
D: 12-SET-95
L. 16.971
15-JUN-98
D: 20-JUL-99
---
---
---
30 d D 2º I.RVIGENTE
17-MAR-96
4
Protocolo de Colonia para la Promoción y Protección Recíproca de Inversiones en el MERCOSUR.
Firmado. Colonia del Sacramento, 17 de enero de 1994
Español - Português
DEC. Nº 11/93
Pendiente
Pendiente
Pendiente
Pendiente
---
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---
30 d D 4º I.R.NO VIGENTE
5
Protocolo sobre Promoción y Protección de Inversiones Provenientes de Estados No Partes del MERCOSUR.
Firmado. Buenos Aires, 5 de agosto de 1994
Español - Português
DEC. Nº 11/94
L: 24554
D: 14-MAR- 96
Pendiente
L: 593
15-JUN-95
D: 12-SET-95
L: 17.531
9-AGO-02
D: 11-JUL-03
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---
---
30 d D 4º I.R.
NO VIGENTE


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  • Referências

2 Mensagens Presidencial nº: 1.079; nº1.080, nº 1.081; nº 1.082; nº 1.083 e nº 1.084, publicadas no diário da Câmara dos Deputados nº 184 de 13/12/2002, pág. 54409 a 54415.
3 Exposição de motivos da Mensagem 162/2004, §3.
4 Débora Bithiah de Azevedo . Os acordos para a promoção e a proteção recíproca de investimentos assinados pelo Brasil , 2001, disponível em <http://bd.camara.gov.br/bd/handle/bdcamara/2542>, acessado dia 09/05/2015
5 Débora Bithiah de Azevedo . Os acordos para a promoção e a proteção recíproca de investimentos assinados pelo Brasil , 2001, disponível em <http://bd.camara.gov.br/bd/handle/bdcamara/2542>, acessado dia 09/05/2015



Bons estudos!

 


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