domingo, 7 de junho de 2015

Defeitos do negócio jurídico


     Os defeitos que veremos acabam por comprometer o requisito da vontade livre e de boa-fé. Os vícios tem relação com o elemento vontade. Vai comprometê-lo. Quando dizemos que o negócio jurídico é inválido, estamos nos referindo ao gênero, porque podemos ter um negócio nulo ou anulável.

Inválido  ----> Nulo (nulidade absoluta)
Inválido |
Inválido  ----> Anulável( nulidade relativa)
 
     Classificam-se em vícios de consentimento, no qual a vontade não é expressa de maneira absoluta (erro, dolo, coação, lesão e estado de perigo), em vícios sociais, no qual a vontade manifesta não tem a intenção pura e de boa-fé que enuncia (simulação e fraude contra credores).

1. Vícios de consentimento
 
1.1 Erro ou Ignorância
 
     Quando a parte acaba por agir diferente da sua vontade, por desconhecer ou distorcer a realidade, se conhecesse a verdadeira situação agiria diferente.
 
     O erro gera negócio jurídico anulável. Esses vícios para que repercutam esse efeito de invalidade do negócio, eles precisam ser alegados e provados.
 

CC, Art. 138. São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio. 

     Erro substanciado está no art. 139, é o erro que incide sobre a essência (substância) do ato que se pratica. É o caso de uma pessoa que quer comprar um jarro de vidro e compra, por engano, uma peça de acrílico. O erro poderá incidir no negócio, no objeto ou na pessoa
 

CC, Art. 139. O erro é substancial quando: I - interessa à natureza do negócio, ao objeto principal da declaração, ou a alguma das qualidades a ele essenciais; II - concerne à identidade ou à qualidade essencial da pessoa a quem se refira a declaração de vontade, desde que tenha influído nesta de modo relevante; III - sendo de direito e não implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo único ou principal do negócio jurídico.

     Enunciado nº 12 (I/2002): “Na sistemática do art. 138, é irrelevante ser ou não escusável o erro, porque o dispositivo adota o princípio da confiança.”
 
     Por muito tempo ficou essa discussão acerca da caracterização desse erro, substancial e escusável (desculpa = desculpável, que poderia ter sido cometido por qualquer pessoa) esse enunciado sinaliza o posicionamento que se essa discussão é escusável ou não tornou-se irrelevante.

     O erro pode atingir a natureza do negócio; a identidade do objeto; a qualidade do objeto.
 
a. Natureza do negócio, troca de uma causa jurídica por outra (comodato com a doação).
 
     Exemplo: João pergunta se eu tenho algum livro para emprestar. Na aula seguinte entrego o livro a ele, terminou o semestre e ele não devolveu o livro. Uma dia cobrei o livro, aí ele disse que achou que podia ficar com o livro. Natureza do negócio, João entendeu que era uma doação, mas o livro tinha uma característica especial, era infungível para mim, tinha a assinatura do autor, era apenas um empréstimo.
 
     Ele é maleável, anulável, pois permite a readequação por vontade das partes.

b. Por identidade do objeto, compra um animal, e leva outro, trocado.
 
     Exemplo: Renata e eu fazendeiras, escolho quatro animais da fazenda dela, percebo que dos quatro, um não é dos que escolhi. Ligo para Renata e aviso, Renata diz que pode ter sido algum engano e envia outro. Mande de volta que substituo. Houve um erro em relação a identidade do animal, era um e veio outro, mas é possível consertar esse erro. É anulável, permite concerto.

c. Qualidade do objeto, comprar um anel imaginando ser de ouro, não se sabe que é de cobre.
 
     Exemplo: chego na sala e Raquel esta com kit de jóias para vender. De longe gostei de um anel. Quando terminou a aula eu perguntei o preço do anel, com base no preço eu deduzi que o anel era de outro branco, com uns três dias o anel ficou preto, então não era de outro branco. Houve um erro da minha percepção que era de ouro branco. É possível solucionar essa situação, sim, depende da vontade das partes, pois é um negócio jurídico anulável. Existe a possibilidade das partes conversarem e solucionar de modo satisfatório para as partes.

     O erro pode atingir ainda a identidade ou qualidades de determinada pessoa.

     Vimos que o negócio jurídico podem ser pessoais, você fez um determinado negócio jurídico com alguém por alguma razão, ou seja, aquela pessoa tem determinadas qualidades que fez você pactuar um negócio jurídico.

     Erro essencial de pessoa pode se configurar em motivo para anulação de casamento civil, que e um negócio jurídico.

     Vamos imaginar que determinado casal, um belo dia a esposa descobre que o marido tem um namorado. Quado ela pactuo o negócio jurídico (casamento) ela raciocinou em cima da qualidades que achava que ele tinha, e agora está vendo que é assim. Se ela quiser continuar casada ninguém a obriga a desmanchar, essa anulação depende da vontade dela. Essa situação configura erro essencial de pessoa. Do mesmo jeito se ela descobrisse que ele era estelionatário, ou coisa afim. 
 
     Ainda o erro pode ocorrer, sendo de direito e não implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo único ou principal do negócio jurídico. (CC, art. 139,  III juntamente com os CC, arts. 142 e 144)
 
     Devem ser lidos à luz do princípio da conservação dos negócios jurídicos (relativização do LINDB, art. 3º), no qual deve o intérprete, desde que não haja prejuízo, e respeitadas as prescrições legais, empreender todos os esforços para resguardar a eficácia jurídica do ato acoimado de invalidade.
 
     Em regra o ordenamento brasileiro não vai aceitar o erro de tipo nem o erro de direito, exceção pode até ser aceito o erro de direito, desde que esse erro de direito não implique em não cumprimento da lei. Embora a regra legal não seja expressa a respeito, o requisito da boa-fé é obviamente indispensável para que se reconheça esta espécie de erro.
 

CC, Art. 142. O erro de indicação da pessoa ou da coisa, a que se referir a declaração de vontade, não viciará o negócio quando, por seu contexto e pelas circunstâncias, se puder identificar a coisa ou pessoa cogitada. (ERRO ACIDENTAL) 
CC, Art. 144. O erro não prejudica a validade do negócio jurídico quando a pessoa, a quem a manifestação de vontade se dirige, se oferecer para executá-la na conformidade da vontade real do manifestante.

 
     Esses dois artigos se reportam ao erro de fato, mais deve haver a situação real, prática.
 
     Exemplo: Existe motivos elencados no CC que podem provocar anulabilidade do casamento. Está no código (art. 1.531- impedimento casamento). No código diz que um dos motivos é que a pessoa ter sido casada e não ter finalizado a partilha de bens, para evitar a mistura patrimonial. Então alguém casa e alega erro de direito, diz que desconhecia, essa situação sugerida pelo código, o que ela não pode é se recusar a cumprir a lei, não pode ser considerado válido, esse casamento vai ser anulado e após a partilha de  bens ele pode se casar.
 
     Exemplo: Mulher comprando lote, para ela estava comprando um lote D da quadra 3, quando ela foi ler o contrato tinha Lote B, quadra 3. Corretor mostra que ela errou, ela se confundiu. Aí ela diz que realmente queria o lote B, aí ela diz que vai refazer a página do contrato. Se o corretor fizer isso resolve a situação. É um negócio anulável, sempre permite adequação.

1.1.1 Falso motivo
 
     O falso motivo só vicia a declaração de vontade quando expresso como razão determinante.
 
     Regra geral, o motivo é irrelevante juridicamente, dificilmente se coloca no contrato o motivo pelo qual está contratando.
 
     Exemplo do lote: interessa a imobiliária saber o motivo que ela está comprando o lote? não.
 
     Mas em algumas situações o motivo é relevante. Exemplo: Digamos que você está procurando uma casa de praia, viu várias e escolheu uma por motivo de ela ter uma grade área, você pode querendo no contrato colocar esse motivo, dizendo que esse contrato está acontecendo em função da área grande que tem na casa. Se em algum tempo aparecer alguém dizendo que é dono daquela área você pode pedir anulação daquele negócio.
 
     Falso motivo só contamina o negócio, se  negócio só aconteceu por causa daquele motivo.
 
     Para que o motivo seja relevante precisa ficar claro se disser que o negócio só aconteceu por causa daquilo.

1.1.2 Transmissão errônea da vontade
 

CC, Art. 141. A transmissão errônea da vontade por meios interpostos é anulável nos mesmos casos em que o é a declaração direta.
CC, Art. 425. É lícito às partes estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais fixadas neste Código.
 
     Do mesmo jeito que a parte pode se equivocar, ela também pode manifestar uma vontade equivocada por meios interpostos. A doutrina vai dizer que dá para utilizar esse artigo para utilizar em contratos eletrônicos. Esse contratos eletrônicos acontecem por meios interpostos, antes era carta, telegrama, hoje é o e-mail, pode-se pactuar e negociar os meios do contrato por e-mail.

1.1.3 Erro material retificável
 

CC, Art. 143. O erro de cálculo apenas autoriza a retificação da declaração de vontade.
 
     Se um negócio jurídico aconteceu aparentemente válido, só que depois perceberam que houve um erro de cálculo, é possível retificar. Pode ser quanto a um valor, a uma metragem, ao peso de um objeto.
 
1.2 Vício de dolo
 
    O segundo vício é o dolo, tem haver com a ideia de má-fé. É o erro provocado por terceiro, e não pelo próprio sujeito enganado.
 
     Artimanhas utilizadas por uma das partes ou por um terceiro, para induzir o outro ao erro. No dolo a pessoa é levada a errar. Raquel que vendeu o anel de bijuteria, dizendo que era de ouro, atua com dolo, e o negócio jurídico poderá ser anulado. Não confundir com fraude, já que o dolo dirige-se especificamente à outra parte do negócio, e não a um número indeterminado de pessoas. 
 
     O dolo deve ser provado por quem o alega, e dispensa-se a prova de efetivo prejuízo.
 
     Existe uma classificação doutrinária: Dolus bonus  X Dolus malus (dolo da má-fé). O Dolo bonus é o dolo sem intenção de enganar, mas sim de enaltecer uma situação, artifício para exaltar o produto, mas depois que o CDC entrou em vigor ele trouxe a disciplina da publicidade enganosa (art. 37, § 1º).

     Quando à extensão dos seus efeitos no negócio jurídico, o dolo poderá ser principal ou acidental. Para invalidar o ato, o dolo deve ser principal, pois ataca a causa do negócio jurídico em si; o dolo acidental não impediria a realização do negócio jurídico, portanto só gera a obrigação de indenizar.

1.2.1 Dolo principal
 

CC, Art. 145. São os negócios jurídicos anuláveis por dolo, quando este for a sua causa.
 
    Também chamado de dolo substancial, essencial, determinante, causal. Gera a anulação do negócio jurídico. Ou seja, dolo quando alegado e provado também gera negócio jurídico anulável. Diz que esse dolo vai contaminar o negócio, desde que ele seja principal, a razão pela qual fiz o negócio. Exemplo do anel, dessa vez olhei o anel e perguntei o preço e se era de ouro branco, Raquel diz que era sim de ouro branco, fui levada a errar pela má-fé de Raquel.

1.2.2 Dolo acidental


CC, Art. 146. O dolo acidental só obriga à satisfação das perdas e danos, e é acidental quando, a seu despeito, o negócio seria realizado, embora por outro modo.
 
     Gera a indenização das perdas e danos. Se eu chegasse para Raquel e dissesse que descobri que o anel não era de ouro branco, ai ela assume que mentiu. Eu digo que me devolva a metade do dinheiro; se chegarem no consenso resolve o negócio porque é um negócio jurídico anulável. Essa devolução do dinheiro significa uma indenização para mim, não precisou desmanchar o negócio, e eu fui indenizada.
 
     Para o dolo ser principal ou acidental depende do caso concreto. No principal a pessoa realmente quer desmanchar o negócio. E se não for amigavelmente entra com ação anulatória alegando erro. Como exemplo o sujeito compra um carro e escolhe cor metálica, mas na entrega enviam um de cor básica; sujeito não desiste do negócio e pede apenas a compensação por perdas e danos. Porém, caso o sujeito só queira o carro se for de cor metálica, é possível que anule o negócio jurídico baseado no dolo.

     Quanto à atuação do agente, o dolo pode ser positivo ou negativo (omissivo). O primeiro decorre de ato comissivo, ardilosamente o vendedor engana o adquirente, e no segundo trata-se de uma abstenção maliciosa, um silencio intencional, deixando a outra parte fazer negócio jurídico diferente do que queria.

1.2.3 Dolo negativo ou omissivo


CC, Art. 147. Nos negócios jurídicos bilaterais, o silêncio intencional de uma das partes a respeito de fato ou qualidade que a outra parte haja ignorado, constitui omissão dolosa, provando-se que sem ela o negócio não se teria celebrado.
 
     Omissão dolosa acerca de um elemento do negócio jurídico. "São requisitos do dolo negativo, segundo Sílvio Venosa (Stolze, p. 392):
 
- intenção de levar o outro contratante a se desviar de sua real vontade, induzindo-o ao erro;
 
- silêncio sobre circunstância desconhecida pela outra parte;
 
- relação de essencialidade entre a omissão dolosa intencional e a declaração de vontade;
 
- omissão do próprio contraente e não de terceiro.

     Exemplo: Alguém vai comprar um imóvel, tem uma placa: tratar com o proprietário. Faz o contrato e tal... só que essa pessoa é interditada por prodigalidade, então esse contrato não podia ser assinada por essa pessoa. Essa omissão do vendedor foi uma omissão dolosa. Dolosamente escondeu a informação.

1.2.4 Dolo de terceiro
 

CC, Art. 148. Pode também ser anulado o negócio jurídico por dolo de terceiro, se a parte a quem aproveite dele tivesse ou devesse ter conhecimento; em caso contrário, ainda que subsista o negócio jurídico, o terceiro responderá por todas as perdas e danos da parte a quem ludibriou.
 
     Exemplo: Orfeu vende réplica de vaso à Caio por intermédio de Tício. Caio queria vaso original, Tício não achou e vendeu a réplica como se fosse original.Se Orfeu tinha conhecimento da ação de Tício, ou não tinha conhecimento mas podia presumir, nesses casos o negócio jurídico pode ser anulado; mas se Orfeu não sabia, nem tinha como saber da atuação dolosa de Tício, o negócio subsistirá e Tício responde pelas perdas e danos devidas a Caio.
 
     Segundo "Maria Helena Diniz, se o dolo de terceiro apresentar-se por cumplicidade de um dos contratantes ou se este dele tiver conhecimento, o ato negocial anular-se-á, por vício de consentimento, e se terá indenização de perdas e danos a que serão obrigados os autores do dolo (Stolze, p. 393)"

1.2.5 Dolo do representante 
 

CC, Art. 149. O dolo do representante legal de uma das partes só obriga o representado a responder civilmente até a importância do proveito que teve; se, porém, o dolo for do representante convencional, o representado responderá solidariamente com ele por perdas e danos.
 
     A primeira parte do artigo trata do dolo legal, do qual a tutela e curatela são exemplos. O representado só responderá até a importância do proveito que teve. 
 
     Já a segunda parte tratado dolo convencional. Como exemplo o contrato de mandato. Representante e representado responderão solidariamente por perdas e danos. Salvo se o representado não sabia, aí só o representante responde.

1.2.6 Dolo recíproco ou bilateral
 

CC, Art. 150. Se ambas as partes procederem com dolo, nenhuma pode alegá-lo para anular o negócio, ou reclamar indenização.

1.3 Coação
 
     Traduz a ideia de violência, presença de coator X coato, coagido, paciente.
 

CC, Art. 151. A coação, para viciar a declaração da vontade, há de ser tal que incuta ao paciente fundado temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens.§ú. Se disser respeito a pessoa não pertencente à família do paciente, o juiz, com base nas circunstâncias, decidirá se houve coação.


     Entende-se como coação capaz de viciar o consentimento toda violência psicológica apta a influenciar a vítima a realizar negócio jurídico que a sua vontade interna não deseja efetuar (Stolze,  p.394).
     São dois tipos de coação, a física (vis absoluta) e a moral (vis compulsiva).
 
1.3.1 Física
 
     Age diretamente sobre o corpo da vítima, neutraliza a manifestação da vontade, torna o negócio inexistente (para alguns, nulo), e não simplesmente anulável.

1.3.2 Moral ou Psicológica
 
     Age no intelecto da vítima, incute na vítima um temor constante, torna o negócio anulável, a manifestação de vontade é perturbada. Por não tolher completamente a liberdade volitiva, é causa de invalidade (anulabilidade) do negócio jurídico, e não de inexistência.
 
     Requisitos para caracterização da coação:
 
- violência psicológica;
 
- declaração de vontade viciada;
 
- receio sério e fundado de grave dano à pessoa, à família (ou pessoa próxima) ou aos bens do paciente.

Análise do caso concreto
 

CC, Art. 152. No apreciar a coação, ter-se-ão em conta o sexo, a idade, a condição, a saúde, o temperamento do paciente e todas as demais circunstâncias que possam influir na gravidade dela.
 
     Ninguém imagina uma franzina senhora idosa ameaçando verbalmente um homem musculoso e saudável, para que aliene o seu imóvel para ela.

Exercício regular de um direito 
 

CC, Art. 153. Não se considera coação a ameaça do exercício normal de um direito, nem o simples temor reverencial.
 
     Exemplo: o locatário tornando-se inadimplente, não poderá afirmar haver sido coagido pelo fato de o locador adverti-lo de que "se não pagar os aluguéis, recorrerá à justiça."

    Semelhante à regra de dolo exercido por terceiro (art. 148)
 

CC, Art. 154. Vicia o negócio jurídico a coação exercida por terceiro, se dela tivesse ou devesse ter conhecimento a parte a que aproveite, e esta responderá solidariamente com aquele por perdas e danos.
CC, Art. 155. Subsistirá o negócio jurídico, se a coação decorrer de terceiro, sem que a parte a que aproveite dela tivesse ou devesse ter conhecimento; mas o autor da coação responderá por todas as perdas e danos que houver causado ao coacto.

     Só se admite a anulação do negócio se o beneficiário soube ou devesse saber da coação, respondendo solidariamente como terceiro pelas perdas e danos.

1.4 Estado de perigo
 
     A parte, nesta situação, não tem escolha, por isso declara a vontade. Essa vontade não é livre, porque a parte manifesta a vontade por pressão.
 
     Exemplo clássico, pai chega com filho no hospital, para que ocorra esse atendimento vai precisar de uma cirurgia, ai o hospital exige uma caução. O hospital diante do grave dano o hospital exige cheque caução de 20 mil reais, certamente ele vai passar o cheque porque ele não tem opção, não tem como ponderar a cerca da manifestação de vontade dele. Esse tipo de negócio jurídico seria em estado de perigo. Caso chegassem a cobrar esse cheque ele podia dizer que estava em estado de perigo, sendo assim um negócio anulável, não é considerado um negócio válido. Juiz vai analisar o caso para ver quanto realmente custou e saber quanto deve ser pago.
 
     Guarda características comuns com o estado de necessidade no direito penal, é uma espécie hipotética de inexigibilidade de conduta diversa. Situação de perigo conhecido da outra parte (elemento subjetivo) + onerosidade excessiva (elemento objetivo). Não existia no código de 1916.
 
O Enunciado nº 148 (III/2004): “Ao “estado de perigo” (art. 156) aplica-se, por analogia, o disposto no § 2º do art. 157.”
 

CC, Art. 156. Configura-se o estado de perigo quando alguém, premido da necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa.
§ú. Tratando-se de pessoa não pertencente à família do declarante, o juiz decidirá segundo as circunstâncias.

1.5 Lesão
 
     É a punição ao chamado “negócio da china”. Desproporção das prestações, gerando um prejuízo a uma das partes. Traduz muitas vezes o abuso do poder econômico de uma das partes, em detrimento da outra, hipossuficiente na relação jurídica.
 

CC, Art. 157. Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta. 
§ 1 Aprecia-se a desproporção das prestações segundo os valores vigentes ao tempo em que foi celebrado o negócio jurídico. 
§ 2 Não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento suficiente, ou se a parte favorecida concordar com a redução do proveito.
 
     No caso da lesão não existe essa necessidade de que a outra parte conheça do perigo, quando o hospital exige o cheque caução e conhece do perigo que a pessoa está correndo; no caso da lesão não existe essa necessidade de conhecer o perigo, essa onerosidade é assumida ou por necessidade ou por inexperiência. É por isso que esses institutos se assemelham, trazendo dúvida no julgador em qual aplicar. Também gera negócio jurídico anulável. A doutrina diz que a lesão é a punição ao chamado negócio da china, serve para demonstrar quando alguém faz um negócio extremamente vantajoso e a outra parte teve extrema desvantagem (prejuízo) a desproporção exagerada é que vai indicar essa lesão.
 
     Requisitos básicos da lesão:
 
- objetivo ou material: desproporção das prestações avençadas;
 
- subjetivo, imaterial ou anímico: a premente necessidade, a inexperiência ou a leviandade (da parte lesada) e o dolo de aproveitamento (da parte beneficiada).

     Incide no momento de formação do negócio e o critério de aferição é objetivo, ou seja, não existe o dolo de aproveitamento da parte beneficiada; É avaliado no momento de formação do negócio jurídico. É critério de aferição objetiva.

Princípio da conservação dos negócios jurídicos (Art. 157, § 2º)
 
    A lesão gera um negócio jurídico anulável, ele é mais maleável pois permite a readaptação. Esse §2º fala sobre a possibilidade da adequação e está em íntima relação com a conservação dos negócios jurídico. Para o sistema é sempre melhor que os negócios jurídicos permaneçam, agora se ele tem algum vício, problema é se der para adequar então vamos manter o negócio. Então na lesão se um lado ficou em extrema vantagem e outro em extremo prejuízo, vamos manter um meio termo. Não precisa necessariamente desmanchar o negócio.
 
     Lesão é a premente necessidade ou inexperiência (elemento subjetivo) + onerosidade excessiva (elemento objetivo).
 
     Enunciado nº 149 (III/2004): “Em atenção ao princípio da conservação dos contratos, a verificação da lesão deverá conduzir, sempre que possível, à revisão judicial do negócio jurídico e não à sua anulação, sendo dever do magistrado incitar os contratantes a seguir as regras do art. 157, § 2o, do Código Civil de 2002.”
 
     Enunciado nº 291 (IV/2006): “Nas hipóteses de lesão previstas no art. 157 do Código Civil, pode o lesionado optar por não pleitear a anulação do negócio jurídico, deduzindo, desde logo, pretensão com vista à revisão judicial do negócio por meio da redução do proveito do lesionador ou do complemento do preço.”
 
     Enunciado nº 410 (V/2011): “A inexperiência a que se refere o art. 157 não deve necessariamente significar imaturidade ou desconhecimento em relação à prática de negócios jurídicos em geral, podendo ocorrer também quando o lesado, ainda que estipule contratos costumeiramente, não tenha conhecimento específico sobre o negócio em causa.”

2. Vícios sociais
 
2.1. Fraude contra credores
 
     Também considerado vício social, consiste nos atos praticados para prejudicar credores preexistentes, já que quem responde pelas dívidas é o patrimônio do devedor.
 

CC, Art. 158. Os negócios de transmissão gratuita de bens ou remissão de dívida, se os praticar o devedor já insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, ainda quando o ignore, poderão ser anulados pelos credores quirografários, como lesivos dos seus direitos.
§ 1 Igual direito assiste aos credores cuja garantia se tornar insuficiente.
§ 2 Só os credores que já o eram ao tempo daqueles atos podem pleitear a anulação deles.
 
     Dois elementos compõem a fraude, o primeiro de natureza subjetiva e o segundo, objetiva:
 
consilium fraudis (o conluio fraudulento)
 
eventus damni (o prejuízo causado ao credor). Costuma-se afirmar que a anulação do ato praticado em fraude contra credores dá-se por meio de uma ação revocatória, denominada "ação pauliana".
 
     Fundamentos da ação pauliana são:
 
- negócios de transmissão gratuita de bens (doação);
 
- remissão de dívidas (perdão de dívida de terceiros);
 
- contratos onerosos do devedor insolvente quando a insolvência for notória e quando houver motivo para ser conhecida do outro contratante (parente próximo é quem adquire)
 
- antecipação de pagamento feita a um dos credores quirografários, em detrimento dos demais (art. 162)
 
- outorga de garantia de dívida dada a um dos credores, em detrimento dos demais (art. 163)

     No caso de fraude de execução o devedor já tem contra si uma execução em tramitação. Não se confunde a fraude contra credores com a fraude de execução (CPC, art. 593). Existe diferença no momento de sua ocorrência, na fraude contra credores o devedor insolvente antecipa-se (alienando ou onerando bens) antes que os credores intentem qualquer ação; na fraude de execução, o devedor já tem contra si processo judicial, capaz de reduzi-lo à insolvência, e ainda assim atua ilicitamente alienando ou onerando o seu patrimônio.

2.2 Simulação 
 
     A simulação está no capítulo referente à invalidade do negócio jurídico, em que considera como causa de nulidade.
 

CC, Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma.
§1 Haverá simulação nos negócios jurídicos quando: I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem; II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira; III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.
§2 Ressalvam-se os direitos de terceiros de boa-fé em face dos contraentes do negócio jurídico simulado.
 
     Vício social que leva frieza de ânimo e pouco respeito ao ordenamento jurídico, é a farsa acerca de um negócio jurídico, ou seja, é celebrado, mas não produz os efeitos que deveria produzir. É uma declaração enganosa de vontade, visando produzir efeito diverso do ostensivamente indicado.
 
Poderá ser:
 
- Absoluta: negócio jurídico formado para não surtir efeito algum; forma-se a partir de uma declaração de vontade ou uma confissão de dívida emitida para não gerar efeito jurídico algum.
 
     Exemplo: simular negócio com um amigo para livrar um bem da partilha de separação judicial.
 
- Relativa (Dissimulação): negócio jurídico formado para cobrir os reais efeitos pretendidos. Emite-se declaração de vontade ou confissão falsa para encobrir ato de natureza diversa, cujos efeitos querido são proibidos por lei.
 
     Exemplo: pai quer vender imóvel a um dos filhos, outro filho não aceita; então o pai forja uma doação, mas na verdade o filho paga pelo imóvel; outro exemplo: homem casado quer doar um bem à sua concubina, proibido por lei, então eles simulam uma compra e venda.

     A reserva mental, não exteriorizada, prevalece a declaração; se exteriorizada e aceita pela outra parte, gera negócio simulado. É a ideia de blefe.
 

CC, Art. 110. A manifestação de vontade subsiste ainda que o seu autor haja feito a reserva mental de não querer o que manifestou, salvo se dela o destinatário tinha conhecimento.

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  • Referência
Aula 2014, Profª Ana Eleonora com anotações de Régia Carvalho, UNIRN
 
GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil, volume 1: parte geral - 11ª ed - São Paulo: Saraiva, 2009
 
 
 Bons estudos!
 
 

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