sábado, 28 de maio de 2016

Falência: efeitos (Lei 11.101/2005)

5. Efeitos da decretação de falência

A sentença que decreta a falência tem natureza constitutiva, instaurando-se um novo regime jurídico aplicável ao devedor, que repercutirá em toda a sua esfera jurídica patrimonial.

5.1 Efeitos da falência quanto à pessoa e aos bens do devedor

O primeiro efeito é a dissolução da sociedade pois haverá o encerramento da atividade empresarial e a liquidação do patrimônio para posterior pagamento aos credores.

Os sócios também são atingidos, sendo que os efeitos variam de acordo com o tipo societário e a função que o sócio exercia.

Na sociedade ilimitada (art. 81) também ocorre a falência dos sócios, devendo eles serem citados para se defenderem. Atinge os sócios que tenham se retirado voluntariamente ou sido excluído da sociedade há menos de dois (2) anos, quanto às dívidas existentes na data do arquivamento da alteração do contrato.

Na sociedade limitada, em princípio não se submetem aos efeitos da falência, pois quem faliu foi a sociedade. Mas caberá ao juiz verificar eventual responsabilidade pessoal do sócio, controladores e administradores. Cuja ação prescreve em dois (2) anos contado do transito em julgado da sentença que encerra a falência.

5.1.1 Inabilitação empresarial

Essa inabilitação está prevista no art. 102 da LRE, na qual o falido fica inabilitado para exercer atividade empresarial a partir da decretação da falência e até a sentença que extingue suas obrigações

No caso de cometimento de crime falimentar, os efeitos da inabilitação devem ser motivados na sentença e pode perdurar por até cinco (5) anos após a extinção da punibilidade, podendo cessar antes por reabilitação penal.

5.1.2 Perda do direito de administração dos bens

Desde a decretação da falência ou do sequestro ocorre a perda direito de administração dos bens bem como a disponibilidade sobre eles, conforme art. 103 da LRE, contudo, o falido pode fiscalizar o administrador.

5.1.3 Deveres específicos do falido

Art. 104. A decretação da falência impõe ao falido os seguintes deveres:
I – assinar nos autos, desde que intimado da decisão, termo de comparecimento, com a indicação do nome, nacionalidade, estado civil, endereço completo do domicílio, devendo ainda declarar, para constar do dito termo:
a) as causas determinantes da sua falência, quando requerida pelos credores;
b) tratando-se de sociedade, os nomes e endereços de todos os sócios, acionistas controladores, diretores ou administradores, apresentando o contrato ou estatuto social e a prova do respectivo registro, bem como suas alterações;
c) o nome do contador encarregado da escrituração dos livros obrigatórios;
d) os mandatos que porventura tenha outorgado, indicando seu objeto, nome e endereço do mandatário;
e) seus bens imóveis e os móveis que não se encontram no estabelecimento;
f) se faz parte de outras sociedades, exibindo respectivo contrato;
g) suas contas bancárias, aplicações, títulos em cobrança e processos em andamento em que for autor ou réu;
II – depositar em cartório, no ato de assinatura do termo de comparecimento, os seus livros obrigatórios, a fim de serem entregues ao administrador judicial, depois de encerrados por termos assinados pelo juiz;
III – não se ausentar do lugar onde se processa a falência sem motivo justo e comunicação expressa ao juiz, e sem deixar procurador bastante, sob as penas cominadas na lei;
IV – comparecer a todos os atos da falência, podendo ser representado por procurador, quando não for indispensável sua presença;
V – entregar, sem demora, todos os bens, livros, papéis e documentos ao administrador judicial, indicando-lhe, para serem arrecadados, os bens que porventura tenha em poder de terceiros;
VI – prestar as informações reclamadas pelo juiz, administrador judicial, credor ou Ministério Público sobre circunstâncias e fatos que interessem à falência;
VII – auxiliar o administrador judicial com zelo e presteza;
VIII – examinar as habilitações de crédito apresentadas;
IX – assistir ao levantamento, à verificação do balanço e ao exame dos livros;
X – manifestar-se sempre que for determinado pelo juiz;
XI – apresentar, no prazo fixado pelo juiz, a relação de seus credores;
XII – examinar e dar parecer sobre as contas do administrador judicial.
Parágrafo único. Faltando ao cumprimento de quaisquer dos deveres que esta Lei lhe impõe, após intimado pelo juiz a fazê-lo, responderá o falido por crime de desobediência.

5.2 Efeitos da falência quanto às obrigações do devedor

A partir do processo falimentar, todos os credores se sujeitarão às regras do do processo, ou seja, só poderão exercer seus direitos sobre os bens do falido conforme prescrever a LRE.

A forma de os credores exercerem seus direitos é por meio de habilitação dos seus créditos (art. 7, ss) ou com ajuizamento de pedido de restituição (art. 85, ss).

Os credores podem voltar-se contra o sócio ilimitadamente responsável, por este submete-se aos mesmos efeitos da sentença que decreta a falência, como eventualmente contra o sócio limitadamente responsável, nos termos do art. 82.

Com a decretação da falência:

- suspende-se o exercício do direito de retenção sobre os bens sujeitos à arrecadação, os quais deverão ser entregues ao administrador judicial (art. 116);
- suspende-se o exercício do direito de retirada ou de recebimento do valor de suas quotas ou ações, por parte dos sócios da sociedade falida(art. 116);
- acarreta o vencimento antecipado das dívidas do devedor e dos sócios ilimitada e solidariamente responsáveis, com o abatimento proporcional dos juros, e converte todos os créditos em moeda estrangeira para a moeda do País, pelo câmbio do dia da decisão judicial (art. 77);
- compensam-se, com preferência sobre os demais credores, as dívidas do devedor vencidas até o dia da decretação da falência, provenha o vencimento da sentença de falência ou não, obedecido os requisitos da legislação civil (art. 122);
- suspende-se a fluência dos juros contra o devedor falido, nos termos do art. 124;

Não se compensam os créditos transferidos após a decretação da falência, salvo em caso de sucessão por fusão, incorporação, cisão ou morte; e ainda os créditos, ainda que vencidos anteriormente, transferidos quando já conhecido o estado de crise econômico-financeira do devedor ou cuja transferência se operou com fraude ou dolo.

5.2.1 Os contratos do falido

Os contratos do falido, bilateral ou unilateral, não se extinguem de pleno direito em razão da decretação da falência, conforme art. 117, mediante autorização do Comitê e em dois casos:

- se o cumprimento reduzir ou evitar o aumento do passivo da massa falida ou
- se for necessário para manutenção e preservação de seus ativos.

No caso de o administrador judicial não se manifestar sobre a continuação do contrato bilateral, o contratante tem 90 dias, a partir da nomeação do administrador, para que este declare, no prazo de 10 dias, se cumpre ou não o contrato (art. 117, §1º).

Se o administrador silenciar ou negar-se a cumprir o contrato, o contratante terá direito à indenização, e seu crédito será quirografário (art. 117, §2º).

Para o autor, seguindo doutrina de Fábio Ulhoa, caso o contrato já tenha sido iniciada a execução, este não pode ser resolvido, não se aplicando as regras do art. 117. Caberá então ao credor se habilitar nos créditos a fim de receber o que lhe for devido.

No entanto, nos contratos que houver a cláusula de resolução por falência, com a decretação da falência implica na resolução imediata do contrato.

5.2.1.1 A disciplina especial de alguns contratos


* Compra e venda mercantil

- Falido é o comprador (art. 119, I)

Nos contratos de compra e venda mercantil, sendo o falido o comprador, se antes da decretação da falência o comprador já tiver revendido a mercadoria, à vista das faturas e conhecimento de transporte, entregues ou remetidos pelo vendedor, não pode o vendedor obstar a entrega das coisas expedidas e ainda em trânsito.

- Falido é o vendedor (art. 119, II e III)

Nos casos de venda de coisas compostas em que não foi entregue por completo, e o administrador judicial decida não continuar com a execução do contrato, cabe ao comprador colocar à disposição da massa falida as coisas já entregues e pedir perdas e danos por meio de ação que correrá perante o juízo falimentar;

No caso de o vendedor falido não ter entregue a coisa móvel ou prestado o serviço que vendera ou contratara a prestações, e o administrador judicial decidindo não executar o contrato, caberá ao comprador se habilitar nos créditos e aguardar seu eventual recebimento.

* Compra e venda com reserva de domínio

- Falido é o comprador (art. 119, IV)

Nos contratos de compra e venda com reserva de domínio, o administrador, ouvido o Comitê, decide não continuar a execução do contrato, será restituído a coisa móvel comprada e exigido a devolução dos valores pagos nos termos do contrato

* Compra e venda a termo de bens com cotação em bolsa ou mercado (art. 119, V)

Nesse contrato, o comprador adquire mercadoria que serão entregues posteriormente, por exemplo uma safra, e se compromete a pagar o preço de acordo com a cotação no momento da entrega.

Caso o administrador judicial decida não dar continuidade ao contrato e antes de aperfeiçoar a entrega ocorrer a falência, deve-se comparar a cotação do dia em que o contrato foi assinado com a cotação do dia em que as mercadorias seriam entregues.

Feito a comparação calcula-se o crédito em favor do devedor falido e o administrador o incorpora à massa. Todavia, calculando-se débito para o devedor, o contratante apenas habilita seu crédito no processo falimentar.

* Compra e venda de bens imóveis (art. 119, VI)

Aplica-se o art. 30¹ da Lei 6.766/79, a qual dispões sobre o parcelamento do solo urbano e dá outras providências.

Assim, havendo falência do promitente vendedor, a promessa de compra e venda deve ser cumprida. E havendo falência do promitente comprador, seus direitos serão arrecadados e vendidos em juízo.

* Contrato de locação (art. 119, VII)

Não se resolve o contrato com a falência do locador, este continuará pagando os aluguéis ao administrador judicial que incorporará os valores na massa falida.

Na falência do locatário, o administrador judicial analisa a conveniência da continuação do contrato, podendo denunciá-lo se entender necessário.

* Obrigações no âmbito do sistema financeiro nacional (art. 119, VIII)


Neste caso "a parte não falida poderá considerar o contrato vencido antecipadamente, hipótese em que será liquidado na forma estabelecida em regulamento, admitindo-se a compensação de eventual crédito que venha a ser apurado em favor do falido com créditos detidos pelo contratante."

* Patrimônio de afetação (art. 119, IX)

"Constituídos para cumprimento de destinação específica, obedecerão ao disposto na legislação respectiva, permanecendo seus bens, direitos e obrigações separados dos do falido até o advento do respectivo termo ou até o cumprimento de sua finalidade, ocasião em que o administrador judicial arrecadará o saldo a favor da massa falida ou inscreverá na classe própria o crédito que contra ela remanescer."

* Mandato (art. 120)

Sendo conferido mandato antes da decretação da falência, com esta cessará seus efeitos, cabendo ao mandatário prestar contas da sua gestão.

Caso seja mandato conferido para representação judicial do devedor, este contrato continua a vigorar até ser expressamente revogado pelo administrador judicial.

E para o falido, na condição de mandatário, cessa o mandato ou a comissão que houver recebido antes da falência. Salvo se matéria estranha à atividade empresarial.

* Contas corrente (art. 121)

Consideram-se encerradas no momento da decretação da falência. Caso haja saldo negativo, o banco deve habilitar o crédito no processo falimentar; sendo positivo, o valor deve ser repassado ao administrador judicial para ser incorporado à massa.

5.3 Efeitos da falência quanto aos credores do falido

Um dos efeitos é a instauração do juízo universal com a consequente suspensão do curso de todas as ações e execuções em face do devedor, com algumas exceções.

A formação da massa falida subjetiva será feita por meio do procedimento de verificação e habilitação dos créditos, regulado nos arts. 7.° e seguintes.
 
5.3.1 A instauração do juízo universal da falência

Com a instauração do juízo universal (princípio da universalidade), ocorrerá a atração de quase todas as ações que envolvam o devedor falido, é a chamada aptidão atrativa do juízo falimentar.

A ressalva se dá nas ações de causas trabalhistas, fiscais e aquelas não reguladas na LRE em que o falido figure como autor ou litisconsorte ativo. E ainda as ações que demandam quantia ilíquida (art. 6º, §1º LRE) e as ações em que for parte a União ou entidade federal (art. 109, I CF/88).

Em todas as ações do devedor falido, o administrador judicial deverá ser intimado para representar a massa falida, sob pena de nulidade do processo.

5.3.1.1 A suspensão da prescrição e das ações e execuções contra o devedor falido

A suspensão da prescrição e de todas as ações e execuções contra o devedor falido será decretada na própria sentença que decreta a falência (art. 99, V), com exceção das que demandam quantia ilíquida e as reclamações trabalhistas (art. 6º, §§ 1 e 2), as quais são processadas no juízo em que foram demandadas. E ainda as execuções fiscais.

Após a liquidação é que poderão ser remetidas para execução do crédito no juízo falimentar.

No caso de a liquidação do processo trabalhista demorar para apurar a definição dos créditos, o juiz competente pode determinar a reserva da importância que estime devida na recuperação judicial ou na falência, e uma vez liquidado, será o crédito incluído na classe própria (art. 6º, §3º, LRE).

As execuções fiscais, também exceção à regra da suspensão, não se sujeita a nenhum tipo de concurso de credores ou habilitação em falência, nos termos do art. 187 do CTN.

5.3.1.2 O tratamento dado às execuções com atos de constrição já realizados

Qual tratamento deve ser dispensado às execuções ajuizadas anteriormente ao decreto de falência nas quais já houve a realização de atos de constrição de bens, por exemplo, a penhora?

A antiga legislação continha regra específica e o STJ entendia que "a execução com penhora já realizada deveria prosseguir, com a realização da hasta pública e a consequente venda do bem. No entanto, o produto resultante da alienação dos bens, os quais foram penhorados antes da decretação da falência, deve ser remetido ao juízo universal da falência, a fim de que neste se proceda aos pagamentos de acordo com a ordem legal de preferência dos créditos."

Todavia, a legislação atual não contém regra específica, o autor acredita que nada impede que se continue entendendo da mesma maneira. Ou seja, decretada a falência, a execução de quaisquer créditos contra o devedor falido deve ser feita no juízo universal da falência, ainda que se trate de crédito trabalhista ou tributário. E o produto arrecadado em atos executórios já iniciados, devem ser remetidos ao juízo falimentar para pagar os credores segundo a ordem de preferência.

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  • Referência:

RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Capítulo VII - Direito falimentar e recuperacional, item 4 - Recuperação Extrajudicial in Direito empresarial esquematizado. 4. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo : MÉTODO, 2014.



 Bons estudos!

 
 
1 - Art. 30. A sentença declaratória de falência ou da insolvência de qualquer das partes não rescindirá os contratos de compromisso de compra e venda ou de promessa de cessão que tenham por objeto a área loteada ou lotes da mesma. Se a falência ou insolvência for do proprietário da área loteada ou do titular de direito sobre ela, incumbirá ao síndico ou ao administrador dar cumprimento aos referidos contratos; se do adquirente do lote, seus direitos serão levados à praça.




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