terça-feira, 24 de setembro de 2013

Hermenêutica Jurídica - Aula - 11 - Hermenêutica Jurídica, Escola dos Glossadores e dos Pós-glossadores


Hermenêutica Jurídica
  • O que faz a hermenêutica jurídica diferente as outras de modo que possa ser especificada?
  • Porque precisamos de uma hermenêutica tipicamente jurídica?
  • Será que poderíamos utilizar os conceitos da hermenêutica como um todo e aplicarmos ao direito?
     Deve existir algo de específico que faz com a hermenêutica jurídica não possa se utilizar indistintamente dos elementos das outras hermenêuticas.

     Em primeiro lugar a hermenêutica jurídica não trabalha unicamente com o desvelamento do sentido. Não é meramente um conhecimento investigativo, semântico. Ela não exaure seu campo com a investigação semântica (ela não trabalha só com significado). Possui um desvelamento, é elemento integrante do processo de formação da decisão jurídica. É por isso que nós temos interpretação é a decibilidade que são as formas de decisão de conflitos. Ela busca também fundamentar uma decisão, não apenas interpretar. Essa é a especificidade deste ramo.

     A hermenêutica jurídica vai interpretar para proferir uma decisão, atua na obtenção de um resultado, ela é pragmática. A vinculação da interpretação é uma resolução de caso concreto (vinculação ao pragmatismo jurídico). Não tem como não ser pragmático, e o critério de solução de conflito impõe sobre a hermenêutica jurídica um caráter mais pragmático.

     A decisão jurídica coloca dois sujeitos (obrigação de um sujeito para como o outro) em uma relação de poder, quem tem o poder da interpretação tem o poder nas mãos.

     É bem fácil nesse momento lembrar da hermenêutica sacra, o papel dos sacerdotes monopolizando, esse misticismo constitucional; o homem cria o texto e se prostra à ele, e como se não tivesse origem no homem, ganham caráter autônomo.

     Quem interpreta a constituição tem o poder de dizer o que é o que não é o direito, assim, a interpretação, a decisão são atos de poder. O poder para dizer o que é o direito, é daquele que interpreta. E a interpretação literal tenta minimizar a função do intérprete. 

    O intérprete exerce uma função criativa, ele dialoga com o autor do texto, o qual não é o dono do texto pois o intérprete possui sua participação. Ambos exercem funções criativas. Portanto interpretar é criar o direito.

     A norma jurídica é um esquema de interpretação da realidade (Hans Kelsen). O direito é uma das formas de interpretação do mundo, ela tem a função de gerar solução de conflitos na sociedade. 

     O surgimento da hermenêutica jurídica, não teria outro local que não fosse Roma. É quando pela primeira vez na solução de um caso concreto o pretor romano se utilizou da interpretação jurídica ao invés de uma interpretação religiosa. Assim fez pela primeira vez a separação entre hermenêutica sacra e jurídica, na solução de um caso concreto. 

     As grandes influências do surgimento da hermenêutica jurídica, são principalmente a dialética grega (mas não a idealista filosófica, e sim a voltada para a retórica - Aristóteles), a argumentação racional (Marco Túlio Cícero).

     É a racionalização da decibilidade dos casos concretos, significa decidir não mais baseado em elementos de base religiosa, e sim racionais, no caso é utilizar a dialética, ou seja, o diálogo entre as partes.

     Daqui surge a jurisprudenttia romana (parecido com o 'precedente' atualmente) e a função dos responsas (ver Tércio Sampaio) o juiz na hora de decidir o caso concretos observa o caso mais racionalmente (rattio juris) do que o caso concreto.

     O trabalho compilador de Justiniano dá origem a primeira escola hermenêutica jurídica - dos glossadores, que tem como base os textos compilados por Justiniano. 

Escola dos glossadores (1ª escola) 

     Foi a primeira escola hermenêutica e tinha como base de interpretação do ''corpus juris civilis'', ela surgiu na época do nascimento das universidades, ou seja, em 1.111 a 1.330 depois de Cristo e o maior representante foi a escola de Bolonha. O grande intuito das escolas dos glossadores era criar um método científico que serviria como base para o ensino jurídico nas universidades. 

     Foi o início da interpretação laica, o direito canônico existia e era vinculante ainda nesse período histórico. O direito estava vinculado à teologia, então existia esse monopólio, depois da reforma protestante vão ser criadas três escolas nesse período histórico.

     O grande intuito dos glossadores era possibilitar o ensino jurídico nas universidades, por isso temos uma forma de interpretação doutrinária (trabalhado muito no Direito), é a doutrina que  delimita os limites e significados dos textos jurídicos. Eles partiam de uma forma de interpretação literal exegética, que é uma tradição justiniana. O receio de Justiniano era perder o sentido original do corpus, ele queria manter a incolumidade do texto.

     A ação do tempo é um problema para a interpretação exegética. A escola dos glossadores surgiu quando ainda não existia uma grande demanda de transformação, assim ele de algum modo conseguia manter sua força normativa, porque o decurso do tempo não alterava o sentido do texto.

     Existem duas coisas que dentro da interpretação exegética que diminuem a força de interpretação do texto: o papel dos intérpretes e o decurso do tempo com as mudanças sociais. Contra o papel dos intérpretes Justiniano se protegeu, mas contra a outra não teve como.

     O objetivo da regra de interpretação literal é de manutenção da autoridade do autor e diminuição das funções do intérprete. A interpretação literal era a regra de interpretação justiniana, que tinham como base textual o direto romano e o direito canônico.

Método das glossas 

     Visava esclarecer o significado da palavra, ou substituí-la, quando possível, por outra análoga. Seriam comentários marginais, interlineares, que apenas possuem a função de aclareamento e delimitação dos sentidos possíveis. É uma forma de interpretação que tenta ser não inovador e não criativo, ou seja, ele tenta não inovar, não criar um sentido, tenta fazer a manutenção do sentido. Se existe passagem obscura no texto o intérprete pode até modificar, mas os glossadores delimitavam as possibilidades de interpretação.

     Os glossadores instituíram uma metodologia que tinha como única base hermenêutica o direito romano e o direito canônico. Os pós-glossadores vão utilizar o direito romano também (Corpus Juris Civilis). Essa escola criará a exegese a dos pandectistas.

     Os glossadores atuais pode-se dizer que são os doutrinadores que comentam as leis para servir de base na interpretação dos operadores de direito.

Escola dos pós-glossadores (2ª escola)

     Os glossadores vão ter uma validade durante um período histórico, certas regras jurídicas se não forem atualizadas perderão força normativa, e assim faz com que esse texto já não resolva mais os casos concretos. Portanto essa escola teve validade naquele período histórico, pois a sociedade não tinha passado por muitas transformações. Com o tempo a base textual além do direito romano e direito canônico será os costumes, será o chamado direito local.

     Assim os pós-glossadores trouxeram uma atualização do direito romano, se for interpretado literalmente ele perderá o sentido. São necessários filtros hermenêuticos para aplicação do Corpus Juris Civilis. O trabalho dos pós-glossadores foi utilizado muito nos tribunais. Os pós-glossadores tiveram uma interpretação costumeira, já os glossadores tiveram uma interpretação doutrinária; os pós-glossadores não utilizavam só a interpretação literal, utilizavam também os costumes.

     Com as mudanças sociais, ocorre a falência da interpretação puramente literal, é necessário que seja aplicada a norma a partir de filtros interpretativos. Esses filtros hermenêuticos seria justamente o costume. O costume ou que chamamos de direito local, por Santo Agostinho nós retiramos pela scriptura dele, a validade jurídica do costume, que ele condenava. Só que na Escolástica passou a se abrir mais para o costume, o qual passa a ser uma fonte jurídica por conta dos pós-glossadores. É por isso que chamamos de escola atualizadora, parte do pressuposto que se a norma não for adequada à evolução social ela perderá sua força normativa. Ficaram em um pequeno drama: manter a força normativa originária como no Corpus Juris Civilis e ao mesmo tempo manter conforme a evolução social. 

     Para a escola atualizadora, a manutenção da força normativa dos "corpus" somente pode advir de sua adequação ao novo contexto social. A grande questão é adequar. Hermenêutica formada pelo Corpus, direito canônico e costumes (direito  local). 

     A escola dos pós-glossadores sofreu influência da atualização dos tribunais, e acrescentou experiência jurídica.

     Questão interessante: estamos vivendo um período de mudança no Código de Processo Penal, qual o grande drama que acomete processualistas? Precisamos realmente de um novo código ou basta utilizar a hermenêutica para manter o Código atual? Será que nos teríamos como manter o atual CPC (que já foi muito reformado) a partir da modificação da sua interpretação adequando aos tempos modernos sem necessariamente ter que criar outro Código? 

Método dos pós-glossadores 

     Criticaram o método dos glossadores e propuseram a criação de um sistema jurídico-racional no qual adequavam o texto aos contextos sociais (pacta sunt servanta vx rebus sic stantibus), havia interpretação segundo os princípios gerais, de forma aberta e progressista.

     Os pós-glossadores precisavam fazer a atualização do texto. Pensando no Código de Processo Civil atual, qualquer tipo de legislação passa por esse problema de precisar ser atualizado. O grande intuito da atualização é não rejeitar o corpus, tem que fazer com que a força normativa seja mantida.

     Pacta sunt servanda significa que os pactos devem ser respeitados, e o rebus sic stantibus é para proteger o bem comum. Quem criou isso basicamente foram os pós-glossadores.



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  • Referência
- Aula 17/09/2013, Hermenêutica Jurídica, Profº Ronaldo Alencar, com anotações de Régia Carvalho.

Bons estudos!

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